O desafio de cada ano lectivo é conseguir dar resposta às necessidades dos alunos cumprindo a nossa função profissional – ser professor. Este ano lectivo foi um ano atípico: não tive alunos – tive adultos/aprendentes, não tive de ensinar – tive de orientar, não tive programa para cumprir – tive referencial para desocultar; não tive Filosofia para leccionar – tive Cidadania e Profissionalidade para certificar. Todo um vocabulário novo e, consequentemente, uma realidade nova para testar a minha capacidade de adaptação e flexibilidade.
Ensinar foi o que aprendi a fazer ao longo da minha vida académica e posteriormente no exercício da docência. Este ano porém, na sequência do ano anterior, tive de reinventar uma nova forma de ser professora: ensinar sem ensinar. Parece contraditório mas não é, parece muito novo, mas também não o é. Sócrates, filosofo do século V a.C. (470/69-399), defendia a ideia de que ninguém ensina nada a ninguém. Evidentemente a sua filosofia era sustentada na crença da imortalidade da alma, mas adaptando esta ideia ao processo RVCC podemos de facto afirmar que aqui o papel do “mestre” não é ensinar mas levar a que os seus “discípulos” através da reflexão, descubram o conhecimento, leia-se competências, que adquiriram ao longo da vida, que descubram o valor do mesmo e se promovam enquanto seres humanos e profissionais, querendo aprender mais, evoluir mais, isto é, queiram ser melhor pessoas e cidadãos. Assim, todo o meu desempenho profissional teve como base esta ideia: ser mais “parteira” do saber do que transmissora de conhecimentos. Neste sentido, as actividades que realizo, são planificadas e aplicadas com esse objectivo, o de despoletar o conhecimento. A complexidade desta tarefa reside na adaptação a diferentes individualidades, o que nem sempre é conseguido (pensá-lo possível é uma utopia) mas foi sempre uma preocupação. Os instrumentos que utilizo são pensados para, primeiro, diagnosticar as competências e/ou as lacunas de cada adulto e, segundo, despertar a reflexão e o debate de ideias sobre alguns temas problemas prementes para o cidadão actual.
Não posso deixar de sublinhar a necessidade que tenho de me informar, de me manter mais atenta ao mundo real, de investigar, de aprofundar assuntos que até aqui não me eram familiares. A realidade dos meus alunos/adultos é uma realidade diferente e com eles aprendo coisas da vida que os livros não ensinam. Quero com isto dizer que enquanto procuro meios e construo instrumentos para avaliar, diagnosticar, orientar, formar e certificar competências eu também cresço como cidadã e profissional.
Fui buscar este texto ao meu arquivo (apenas ajustei os tempos verbais) porque queria partilhar convosco como sentia e ainda sinto este processo RVCC. Gostaria de poder continuar a dizer que é um processo válido para um público específico que ao longo da sua vida adquiriu competências: criou empregos, dinamizou projectos, trabalhou com empenho, investiu na formação profissional, emigrou e leu autores portugueses e estrangeiros, partilhou saberes decorrentes das viagens que realizou, constituiu família e que não teve tempo, oportunidade ou vontade suficiente para ir à Escola frequentar um curso do ensino regular.
AFL